Resultados da auditoria da Deloitte ao NB |
Analisadas 283 decisões que redundaram em perdas de 4.042
milhões de euros (ver quadro) que por coincidência se aproximam dos valores do
capital contingente – 3.890 milhões de euros – e que anda â volta do que o primeiro-ministro
nos disse em 2017 que seria necessário injectar no banco caso fosse
nacionalizado - 4.000 a 4.700 milhões de euros, recordando que a Lone Star
injectou mil milhões.
O que nos leva a admitir que todas estas perdas são há muito conhecidas.
Mas vamos por partes.
O que nos dizem as Finanças:
- As perdas que o NB registou remontam a decisões
tomadas durante a liderança de Ricardo Salgado (ponto 6);
- Existiam “insuficiências e deficiências graves de
controlo interno” na concessão e acompanhamento de crédito e em
investimentos financeiros e imobiliários até 2014, ou seja, e mais uma vez,
durante a liderança de Ricardo Salgado.
Porque é que nada disto é novo? Ou o que já sabíamos embora
dito de outra forma?
Sobre os valores, é interessante verificar como andamos
sempre a falar em valores em torno dos 4 mil milhões de euros:
- Quando o banco foi vendido à Lone Star, 7.900 mil milhões
de activos do NB ficaram fora do perímetro da aquisição: as perdas que
registassem seriam suportadas pelos 3.890 milhões de euros de capital
contingente. Este último é o tal montante que tem vindo a ser transferido
anualmente pelo Fundo de Resolução para o Novo Banco com empréstimos do Estado
e do qual sobram 912,3 milhões de euros. Podemos assumir que, da avaliação ao
NB para a sua venda resultou que se esperava perder cerca de 50% do valor desses
activos (49,2%). Já se sabia, então, que estavam sobrevalorizados.
- Quando o primeiro-ministro anunciou a venda do Novo Banco a
31 de Março de 2017 revelou implicitamente que tinha noção das perdas que ainda
estavam para chegar. Como se pode ouvir
na RTP (ao minuto 28), quando questionado sobre as razões da não
nacionalização do banco, António Costa disse que o Estado teria de injectar de
imediato 4 a 4,7 mil milhões de euros, correspondentes às necessidade imediatas
de capital e a todas as eventuais necessidades futuras. No cenário de venda, o
Lone Star injectou mil milhões e as necessidades futuras a suportar pelo Estado
ficaram limitadas a 3,89 mil milhões.
Quanto às insuficiências de controlo interno:
- Sem querer cometer o erro de acertar nos resultados depois
dos jogos, depois do que vimos ter sido a prática passada de concessão de
crédito na CGD, por via da auditoria da E&Y, dificilmente poderíamos
esperar que um banco com as características de gestão do BES, centralizado na
pessoa de Ricardo Salgado, cumprisse regras de controlo interno.
- A
acusação do Ministério Público divulgada a 14 de Julho, em que Ricardo Salgado
surge como liderando uma associação criminosa, dificilmente poderíamos esperar
outra conclusão de uma auditoria.
As conclusões relativas ao tempo da gestão do BES por
Ricardo salgado assim como as necessidades de capital que o Novo Banco ia ter trazem,
por isso, poucas surpresas.
Foi a resolução mal feita?
Essa é a acusação que está a ser feita, nomeadamente pelo deputado
do PS João Paulo Correia. Fica implícito que alguns desses activos deveriam ter
ficado no “BES mau”. É difícil dizer quem tem razão, mas ficam aqui alguns
argumentos a favor das decisões que foram tomadas:
- No BES mau ficaram activos que tinham relação com os
accionistas.
- A transferência para o “BES mau” de alguns dos activos que
se têm transformado em perdas para o NB significaria dar mais recursos, poucos
que fossem, aos credores e accionistas do NB, que correspondem basicamente à
família Espírito Santo.
- Parte das imparidades que têm vindo a ser registadas têm
sido determinadas por alterações na política de registo de perdas (regras de
transição da IFRS9); por características dos créditos – alguns dos
financiamentos concedidos pelo BES de Ricardo Salgado só exigiam pagamentos de
juro e amortização no fim do prazo contratado adiando assim o registo de perdas;
e finalmente pelas vendas aceleradas que a gestão do NB tem feito – depressa e
a bom dinheiro não há quem.
E esta última questão remete-nos para a pergunta: Está o
NB a vender depressa demais os activos problemáticos e protegidos pelo dinheiro
do Fundo de Resolução?
Não é uma resposta fácil. No caso dos créditos poderia conseguir
mais dinheiro se negociasse directamente com o credor. No caso dos imóveis já é
mais difícil de perceber, embora se possa admitir que vendas mais lentas
pudessem garantir mais dinheiro. Já falei sobre este tema no artigo noObservador e espero voltar a ele. Até porque há aspectos no comunicado do
Ministério das Finanças que não se percebem ainda bem (ver ponto 10).
Ministério das Finanças: Comunicado relativo à
conclusão da auditoria especial ao Novo Banco
1. O Governo
recebeu o relatório da auditoria especial ao Novo Banco, elaborado pela
Deloitte, determinada pelo Governo em cumprimento da Lei n.º 15/2019, de 12 de
fevereiro.
2. Trata-se da
primeira ocasião de aplicação da referida Lei, que exige a realização de uma
auditoria, por entidade independente, sempre que são disponibilizados direta ou
indiretamente fundos públicos a uma instituição de crédito.
3. Conforme
estava previamente definido, o relatório será igualmente disponibilizado e remetido
pelo auditor ao Banco Central Europeu, ao Banco de Portugal, ao Fundo de
Resolução, à Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões e à
Comissão do Mercado de Valores Mobiliários. O Governo acabou de remeter o
relatório à Assembleia da República, conforme se tinha comprometido.
4. A auditoria
especial tem por objeto um conjunto alargado de operações que originaram perdas
para o Novo Banco, entre 04.08.2014 e 31.12.2018:
5. Os trabalhos
de auditoria analisaram atos de gestão praticados entre 01.01.2000 (data de
corte estabelecida para efeitos de análise retrospetiva dos atos de gestão) e
31.12.2018, relativamente às 283 operações que integram o objeto da auditoria,
abrangendo, portanto, quer o período de atividade do Banco Espírito Santo, quer
o período de atividade do Novo Banco.
6. O relatório da
auditoria especial evidencia que as perdas incorridas pelo Novo Banco
decorreram fundamentalmente de exposições a ativos que tiveram origem no
período de atividade do Banco Espírito Santo e que foram transferidos para o
Novo Banco no âmbito da resolução.
7. O relatório da
auditoria especial é extenso e exigirá uma análise técnica cuidada, objetiva e
responsável por parte de todos aqueles a quem foi enviado.
8. O relatório
descreve um conjunto de insuficiências e deficiências graves de controlo interno
no período de atividade até 2014 do Banco Espírito Santo no processo de
concessão e acompanhamento do crédito, bem como relativamente ao investimento
noutros ativos financeiros e imobiliários.
9. O relatório
descreve também os progressos realizados nestas matérias no período de
atividade do Novo Banco.
10. Não
obstante a evolução verificada no período de atividade do Novo Banco, o Governo
considera imprescindível que sejam desenvolvidas, por todos os intervenientes,
todas as ações necessárias para assegurar a rápida e integral correção das
questões identificadas no relatório da auditoria especial. Reitera-se a
importância do integral cumprimento dos compromissos contratualmente assumidos,
designadamente perante o Fundo de Resolução, o qual deverá avaliar quaisquer
situações identificadas à luz das respetivas prerrogativas.
11. O
relatório da auditoria especial vai ao encontro da posição sempre sustentada
pelo Governo sobre a solidez do sistema bancário e a prevenção de crises:
a) A importância
de as instituições de crédito disporem de adequados mecanismos de governo e de
controlo interno;
b) A necessidade
de uma supervisão eficaz e coordenada das instituições de crédito, que assegure
a prevenção e mitigação dos riscos financeiros.
12.
Destaque-se a importância do objetivo da preservação da estabilidade
financeira, a qual tem contribuído, entre outros, para a melhoria das condições
de financiamento da economia portuguesa desde 2016 até ao presente.
13.
Atendendo às matérias analisadas, à abrangência temporal da análise da
auditoria especial, que incide sobre um período muito alargado da atividade do
Banco Espírito Santo até 2014 relativamente ao qual estão em curso processos
criminais, e à necessidade de salvaguarda dos interesses financeiros do Estado,
o relatório será remetido pelo Governo à Procuradoria-Geral da República
considerando as competências constitucionais e legais do Ministério Público.
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