quarta-feira, 6 de julho de 2011

A Moody’s tem razão (e não tem)

A decisão da Moody’s de colocar o ‘rating’ de Portugal em lixo é um banho de gelo sobre a expectativa de que plano da troika e novo Governo significa salvação. Uma enorme ilusão. O problema não é (apenas) técnico, é político. O que significa que temos de ser mais troikistas que a troika.

As agências de rating ouvem o que nós ouvimos e ouvem mais, ouvem aquilo que se diz nos corredores do euro. E perguntam: será que os líderes do euro querem mesmo salvar a Grécia e Portugal?

Vejamos o argumento da Moody’s:

1. Portugal corre o risco de não cumprir os objectivos de redução do défice orçamental e de estabilização do endividamento acordados com a troika por causa dos “enormes desafios que o País enfrenta ao nível da redução da despesa e do combate à fuga fiscal, para impulsionar o crescimento económico e apoiar o sistema financeiro."

2. A banca portuguesa regista a "possibilidade não negligenciável” de “precisar de mais apoio do que o que está previsto no acordo” com a Troika

3. Como consequência (de 1. e 2.) Portugal corre um "risco crescente de precisar de um segundo plano de assistência financeira antes de conseguir regressar aos mercados financeiros".

4. E em face da probabilidade de precisar de mais ajuda (concluído em 3.) a abordagem recente à crise da dívida na Grécia criou “uma maior possibilidade de colocar como pré-condição para novos empréstimos a participação dos credores privados".

Ou seja, o mundo mudou outra vez, mostrando mais uma vez que o problema é político:
  • A Moody’s, que defende os interesses dos investidores, dada a probabilidade de Portugal precisar de um empréstimo adicional – já previsto e admitido antes – e face à nova perspectiva, que a Zona Euro gerou com a Grécia, de envolver os credores privados, avisa os investidores financeiros que podem perder mais dinheiro com activos portugueses do que previam ou do que já estão perder.
E o mundo não mudou outra vez, revelando mais um vez como o problema é político:
E o mundo expõe os desejos políticos secretos por linhas tortas:
E eis que voltamos à pergunta fundamental: Querem alguns países do euro que Portugal se mantenha no euro? Ou querem expulsar do euro Portugal, tal como a Grécia, a Espanha e, como efeito colateral, a Irlanda?

Esta é a pergunta que os líderes dos países do euro têm de responder com actos e declarações públicas e privadas. Porque são dúvidas quanto à vontade política de manter o euro como está que justificam o comportamento das agências de ‘rating’ e a reacção dos mercados financeiros.

As agências de ‘rating’ sabem que alguns países do euro estão convencidos que estariam melhores sem a Grécia, Portugal, Espanha e, porque parecia mal, a Irlanda. Gostariam também de ver a Itália fora, mas isso é mais difícil. Passámos do Clube Med como chamava a este grupo de países, em 1998, o então ministro das Finanças holandês Gerrit Zalm para os PIIGS e GIPSI. O problema é o mesmo.

É exactamente porque o problema é político que hoje como na altura temos de cumprir o plano da troika e ser até mais troikistas que a troika.

Não podemos dar um único pretexto técnico – como não o demos na altura do exame para a entrada no euro em 1998 – para a justificação política do lamentamos, mas não são capazes de estar na União Monetária.

É por isso que devíamos ter aprovado o PEC IV. Mas o passado pouco importa.

Hoje o Governo tem de cumprir escrupulosamente as medidas impostas pela União Europeia e pelo FMI e, no que for possível, adoptar ainda mais medidas que reduzam rapidamente as necessidade de financiamento externo da economia portuguesa. Por isso é que o imposto extraordinário é uma boa medida. E cada um de nós, na medida do que pudermos e se queremos continuar no euro, tem de consumir menos e poupar mais.

O problema das agências de ‘rating’? Sim, são um problema.

É verdade que se a Zona Euro tivesse tido outra abordagem do problema grego, se mostrasse vontade política de o resolver, a Moody’s não teria cortado o rating de Portugal em 4 níveis para Ba2. Uma possível abordagem, que efectivamente resolveria o problema foi em devida altura defendida por Tremonti e Juncker e hoje temos mais uma nova abordagem de Stuart Holland e Yanis Varoufakis.

Mas há mais. As agências de ‘rating’ mostraram que são factores de instabilidade dos mercados, alimentando as euforias e os pânicos. Têm o poder de confirmar as suas próprias previsões. É preciso mudar e reduzir o seu poder. Mas esse é outro problema que tem de ser resolvido a nível global mas que não resolverá o problema de Portugal.

A nós apenas nos resta, neste jogo do finge que ajuda, não dar pretextos técnicos. Isso significa mais do que cumprir o plano da troika, com a prudência que o elevado endividamento das famílias e empresas exige. A alternativa, sair ou ser expulso do euro, é muitissimo pior, um autêntico pesadelo.

4 comentários:

Francisco disse...

Boa tarde

Um bom texto muito pedagógico para entender, o que se está a passar

Pedro Amorim disse...

Cara Helena,
Gostei francamente, embora não concorde com tudo.
Já não é a primeira vez que sua capacidade analítica é bem melhor evidenciada neste espaço que nos comentários na televisão e no Negócios.

Anónimo disse...

Sair ou não sair do Euro não vai ser decidido por nós.
As circunstâncias vão impor o que vai acontecer.

Anónimo disse...

Boa Tarde,

Desculpe mas devo discordar de muita coisa que diz, ainda que esteja a dizer uma séire de verdades e que não esteja a mentir, mas os factos não devem ser avaliados á luz de como avaliou, senão vejamos.

Criem uma ou duas ou três ratings Europeias e depois digam qual o resultado da California e do FED, ainda agora Obama veio pedir a possibilidade de se endividarem mais, será que isto não é lixo, provavelmente pior que Portugal ... ou apenas por serem grandes podem fazer o que querem ... e ninguêm emite ratings sobre eles, ou pelos menos não publicitam ....

É fácil estar sentado à secretária e à distância de um clique opinarem sober a vida de milhões de uma forma irresponsável ...

Isto na realidade é bem mais grave que o que pensam, existem muitos interesses, desde cambiais a outros, e nunca sabemos o que está por trás.

Sinceramente vejam as opções de Stuart Holland e Yanis Varoufakis, ainda recentemente ouvi Stuart e pareceu-me algo muito interessante e ser a resposta actual, doutra forma vão a judar a destruir paises, familias, lares, ... e isto parece fácil quando não nos toca, e se chegar a nossa vez ....

Pensem bem nisto.

Isto daria muito que falar, e outros temas, mas a maioria tem medo de falar e tomar atitudes ...

Abraços e que exista bom senso e atitude e RESPONSABILIDADE SOCIAL E MORAL,

( Espero que não tenham receio de publicar isto )